quarta-feira, 16 de janeiro de 2019

Estatuto do Desarmamento é alvo de 187 projetos no Congresso

A fachada do Congresso Nacional, em Brasília

Com 15 anos de idade recém-completados, o Estatuto do Desarmamento, lei federal vigente desde dezembro de 2003, está prestes a ver a ofensiva mais intensa visando a sua alteração, ou até mesmo revogação. Além do decreto para facilitar a posse de armas, que deve ser publicado nesta terça-feira, 15, o governo Jair Bolsonaro promete ainda negociar com o Congresso mudanças mais profundas. No parlamento, encontrará ambiente fértil: de 2003 ao ano passado, 362 propostas de lei foram apresentadas com intenção de alterar o estatuto; 187 seguem em tramitação.

Os dados são de levantamento do Instituto Sou da Paz feito a pedido do Estado. A maior parte das propostas vem da Câmara, onde foram apresentados 324 dos 362 projetos, e onde ainda tramitam 180 deles. O foco dos legisladores tem sido atacar restrições à concessão de porte de arma de fogo, a autorização para se andar armado na rua, visando a facilitar a permissão para várias categorias profissionais, de pilotos de aeronaves comerciais a caminhoneiros.

Os projetos envolvem ainda ideias como a criação de um porte rural de arma de fogo, o aumento de penas para quem for flagrado cometendo crimes com uso de armas e até mesmo a revogação de competência da Polícia Federal no assunto, devolvendo as atribuições às polícias estaduais, como era antes de 2003. A proposta considerada mais avançada é o PL 3722/2012, do deputado Rogério Peninha (MDB-SC), que tramitou em comissão especial, mas não foi votada em plenário.

Quando tratar o assunto no Congresso, Bolsonaro estará entre amigos. Aliados próximos, e ele mesmo, figuram entre os que mais propuseram projetos sobre o tema. O deputado Alberto Fraga (DEM-DF) está no topo, com 17 projetos, entre eles o que quer conceder porte de arma a deputados e senadores. Completam a lista, o agora ministro-chefe da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, além do senador eleito Major Olímpio (PSL-SP) e o deputado federal reeleito Eduardo Bolsonaro (PSL-SP), filho do presidente.

"O local certo para o debate sobre esse tema é o Congresso. Já vivi essa briga desde 2003", afirmou Fraga. "Bolsonaro está tentando tirar as travas para que o cidadão tenha seu direito de escolha assegurado. O estatuto nunca resolveu absolutamente nada", disse ele, que não conseguiu o governo do Distrito Federal e deixará a Câmara.

Se as mudanças avançarem, porém, não serão as primeiras. O estatuto já teve alterações, como a concessão do porte de arma a guardas municipais, agentes penitenciários e auditores, além de, mais recentemente, ter sido mudado via decreto. O ex-presidente Michel Temer estendeu, em 2016, o prazo de validade de registros de arma de três para cinco anos, além de ter flexibilizado exigências para exames de capacidade técnica.

"Há uma miríade de projetos que tentam enfraquecer a política de controle de armas. Poucos são bons", diz o coordenador de relações institucionais do Instituto Sou da Paz, Felippe Angeli. Os pesquisadores ressaltam o papel da lei em frear o aumento de assassinatos em seus primeiros anos. Estimativa do Mapa da Violência aponta que o cenário seria bem pior sem o estatuto. No ritmo em que estavam, os homicídios teriam atingido 133 mil vítimas a mais em dez anos ante ao que foi de fato registrado.
Decreto
Nesta segunda-feira, 14, o governo informou que o decreto que facilita regras de posse de armas, em que o cidadão pode ter o equipamento em casa ou estabelecimento comercial, será divulgado nesta terça. Alguns critérios objetivos devem ser definidos, como morar em cidade violenta ou área rural. Uma das ideias é classificar município violento como aquele com taxa de homicídios maior do que 10 a cada 100 mil habitantes. Outros requisitos - como bons antecedentes, curso de tiro e teste psicotécnico - serão mantidos. Já a validade de registro de armas deve passar de 5 para 10 anos. O PT ameaça acionar o Supremo Tribunal Federal contra a medida.
Como é fora do Brasil

Exceto em Estados onde há legislação específica, nos EUA basta consulta simples de antecedentes criminais para comprar arma de fogo. Já no Reino Unido e Alemanha, a legislação é mais restritiva e exige, por exemplo, participar de clube de tiro. Nos EUA, em 2016 houve 4,46 homicídios por arma de fogo por 100 mil habitantes, segundo dados mais recentes do Instituto Gun Policy, da Universidade de Sidney. O índice é de 0,05 na Alemanha (2014) e de 0,04 no Reino Unido (2013).