segunda-feira, 5 de junho de 2023

Iniciativa ‘Brasil contra Fake’ do governo Lula tem erros, falta de transparência e inconsistências


 












Na página inicial do site Brasil contra Fake, iniciativa lançada pelo governo Lula (PT) em março para o combate à desinformação, aparece a mensagem: “Aqui você encontra respostas para as principais fake news envolvendo o governo federal”.

No entanto, em meio a desmentidos alertando a população contra golpes online ou sobre o fim de benefícios sociais, o site traz também textos com dados incorretos, sem transparência sobre as fontes ou mesmo inconsistentes em sua argumentação.

O Brasil contra Fake faz parte de uma ofensiva mais ampla do atual governo com a justificativa de combater desinformação, que incluiu uma proposta controversa de “Procuradoria da Democracia”, a atuação do Ministério da Justiça junto às plataformas e sugestões ao PL das Fake News na Câmara. No momento, está aberta uma consulta pública sobre a política de educação midiática

No site que está sob o guarda-chuva da Secom (Secretaria de Comunicação Social da Presidência da República), comandada pelo ministro Paulo Pimenta, uma das publicações diz: “Governo não impôs sigilo a visitas ao Palácio da Alvorada”.

O próprio GSI (Gabinete de Segurança Institucional) do governo Lula, porém, barrou acesso à lista de visitantes do Alvorada sob a justificativa de que os dados possuíam “classificação sigilosa no grau reservado”. Depois, citando entendimento da CGU (Controladoria-Geral da União) de fevereiro, disse que restringiria acesso apenas às visitas de caráter pessoal.

Em seu site, a Secom diz que “a CGU confirma o sigilo imposto pela LAI [Lei de Acesso à Informação] às informações que revelem aspectos da intimidade e vida privada das autoridades públicas e de seus familiares”. Procurada pela Folha sobre o título, a pasta diz considerar que não se pode falar em decretação de sigilo sem ato administrativo específico.

Em uma publicação do final de maio, ao rebater que o governo tenha anunciado a interrupção da divulgação de dados referentes a casos e mortes da Covid-19, o site afirma que o painel Coronavírus do Ministério da Saúde segue sendo atualizado diariamente, quando na verdade o ministério divulgou em março que os dados passariam a ter divulgação semanal.

À Folha a Secom disse que se baseou na aba “sobre” do painel do ministério —o texto do Brasil contra Fake seguia incorreto até a publicação desta reportagem.

Publicado no fim de março, um texto de dois parágrafos do Brasil contra Fake tem como título: “Móveis foram comprados para recompor patrimônio destruído no 8 de janeiro”. Não são apresentados documentos ou qualquer detalhe a respeito da compra.

O texto afirma que é falsa informação de que o presidente teria que “restituir o valor de móveis comprados pelo Palácio do Planalto”.

A desinformação que circulou a esse respeito, no entanto, tinha como referência uma compra com dispensa de licitação cujos móveis eram destinados ao Palácio da Alvorada —que não foi alvo de invasão no dia 8 de janeiro.

Folha perguntou se o texto tratava de alguma outra compra de móveis. Neste caso, que fossem enviados links ou prints de conteúdos desinformativos sobre outra compra. A Secom respondeu afirmativamente e enviou um link do Kwai, informando que o conteúdo tinha sido apagado pela plataforma.

Disse também que “essa mesma fake news foi refutada pelo UOL”. O texto enviado, porém também faz referência à dispensa de licitação 7/2023, que serviu para compra de móveis para o Alvorada.

Sigilo de visitas no Alvorada

Em março, o GSI negou acesso a lista de visitas do Alvorada alegando sigilo. Depois, citando entendimento da CGU de fevereiro, disse que restringiria acesso apenas às visitas de caráter pessoal.
Um dos textos do site da Secom tem como título: “Governo não impôs sigilo a visitas ao Palácio da Alvorada”. No mesmo texto, a Secom diz que “a CGU confirma o sigilo imposto pela LAI às informações que revelem aspectos da intimidade e vida privada das autoridades públicas e de seus familiares.”

Procurada pela Folha sobre o título, a pasta diz considerar que não se pode falar em decretação de sigilo sem ato administrativo específico.

Divulgação de dados Covid-19

Em texto com título “Governo brasileiro continua divulgando dados referentes ao Covid-19”, o site Brasil contra Fake desmente que o governo tenha anunciado a interrupção da divulgação de dados referentes à Covid-19, afirmando que o Painel Coronavírus “é atualizado diariamente com informações das secretarias estaduais de saúde”. Em março, no entanto, o Ministério da Saúde emitiu uma nota informando que as secretarias passariam a enviar os dados da doença semanalmente.

Móveis do Alvorada

Em texto com o título “Móveis foram comprados para recompor patrimônio destruído no 8 de janeiro”, o Brasil contra Fake afirma que não procede informação repercutida nas redes sociais de que o presidente Lula “deverá restituir o valor de móveis comprados pelo Palácio do Planalto”.

Desde fevereiro, o governo Lula vinha sendo alvo de críticas da oposição e alvo de desinformação nas redes devido a uma compra de móveis por meio de dispensa de licitação publicada no Diário Oficial de 3 de fevereiro. O valor inicialmente divulgado era de R$ 379 mil.

Em abril, a Folha divulgou, com base em informações prestadas pelo governo, que a compra foi de R$ 196,7 mil em cinco móveis e um colchão para o Palácio da Alvorada —que não foi alvo de invasão no dia 8 de janeiro. Os outros bens não foram entregues, por isso os valores diferentes.

Vacina

Um texto do Brasil contra Fake que desmente que a vacina possa causar Alzheimer tem problemas de transparência das fontes usadas e inconsistências na argumentação, conforme avaliação de médicos consultados pela Folha. Eles explicam que há diferentes artigos científicos que poderiam ter sido usados para embasar o texto.

No entanto, ao acessar o único arquivo linkado no texto, não é possível identificar seu título e a autoria –o PDF começa na “introdução”. Nenhum estudo ou especialista é citado no texto.

Além disso, o documento linkado não tem relação com Alzheimer ou doença similar. Conforme informou a Secom, trata-se de trabalho de mestrado de 2010. O tema, em linhas gerais, é a produção de anticorpos com veneno de cobra. O ponto de intersecção é que ele fala sobre adjuvantes, substância presente na vacina e alvo das fake news desmentidas.

Folhapress