
Pelo menos três pessoas foram retiradas das galerias do plenário da Assembleia pelos seguranças da Casa, por ordem do presidente do Legislativo, deputado Ademar Traiano (PSDB), sob a acusação de causarem tumulto e desrespeitarem os parlamentares durante a discussão do polêmico projeto "escola sem partido", nesta segunda-feira (16) que pretende restringir discussões sobre política, sexualidade e gênero nas salas de aula. Manifestantes contrários e favoráveis à proposta entraram em confronto, trocando palavras de ordem e também vaiando os deputados que discursavam sobre a matéria.
Protocolado em dezembro de 2016, o “escola sem partido” tem o apoio da bancada evangélica e é uma das bandeiras do grupo político do presidente Jair Bolsonaro. Ele chegou a entrar em pauta em 28 de maio último, mas foi retirado por dez sessões, por 26 votos a 22. A iniciativa é chamada pelos professores de “lei da mordaça”, por ferir a liberdade de ensino. Já os defensores alegam que o projeto visa combater a suposta "doutrinação política" nas escolas públicas.
Primeiro a falar, o deputado Goura (PDT) defendeu a rejeição do projeto. Segundo ele, o "escola sem partido" seria apenas "uma cortina da fumaça" defendido por uma "cruzada moralista e hipócrita". Já o deputado Alexandre Amaro (Repub) defende a iniciativa. "O projeto não é inconstitucional. Apenas reforça direitos e deveres que já estão na lei. Não cria nada de novo", alegou.
Um dos autores do projeto, o deputado Ricardo Arruda (PSL) defendeu a proposta. "O projeto visa apenas proibir as malditas ideologias, seja de gênero ou política", afirmou Arruda. Ele alegou que pesquisas indicariam que a maioria da população seria a favor da proposta, e que seu partido, o PSL, vai divulgar os nomes dos deputados que votarem contra o projeto. "Eu faço questão de mostrar. Nós do PSL vamos divulgar", ameaçou Arruda, que chegou a bater boca com o presidente da Assembleia, por não dar mais tempo para que ele falasse. "Estou achando que o senhor também não é favorável ao projeto", disse o parlamentar.
As declarações de Arruda motivaram mais uma onda de vaias dos manifestantes, levando Traiano a ameaçar esvaziar as galerias.
Em seguida, o líder do PPS, deputado Douglas Fabrício, leu parecer da direção nacional do partido contrário ao projeto. Segundo ele, a Constituição Federal é clara ao definir que a educação é muito mais do que simplesmente "transmissão de conteúdo", e tem como princípios a liberdade de aprender e de ensinar e o pluralismo de ideias.
Nesse momento, Traiano mandou os seguranças retirarem uma mulher que começou a gritar contra a posição de Fabrício. O deputado do PPS também discutiu com Ricardo Arruda, que pediu um aparte para reclamar do tempo a mais concedido a ele. "Eu respeitei Vossa Excelencia. Então me respeite", disse Fabrício, que afirmou "não ter medo de partido nenhum".
Por votla das 16h13, Traiano teve que mandar retirar outra manifestante que gritava durante o discurso do deputado Professor Lemos (PT), contrário ao projeto. "É mentira que nossas escolas tenham partido. Se fosse verdade, só seriam eleitos deputados de um partido", disse o parlamentar.
Logo em seguida, o presidente da Assembleia mandou retirar um terceiro manifestante que usava um boné e era contrário ao projeto.
Constitucionalidade - O Ministério Público (MP) e Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) afirmam que a iniciativa é inconstitucional, por ferirem a liberdade de ensino. Tanto o MP quanto a OAB já manifestaram a intenção de recorrer à Justiça caso a proposta seja aprovada. Em junho do ano passado, a Justiça suspendeu votação de projeto semelhante na Câmara de Curitiba.
O projeto reproduz praticamente o mesmo texto de propostas semelhantes que vêm sendo apresentados por parlamentares das bancadas evangélicas e de outros setores em câmaras municipais e assembleias de todo o País. Ele estabelece a obrigatoriedade de fixação de cartazes nas escolas informando que é proibida em sala de aula, a prática de “doutrinação política e ideológica”, bem como a veiculação de conteúdo ou a realização de atividades de cunho religioso ou moral que possam estar em conflitos com as convicções dos pais ou responsáveis.
A proposta prevê ainda que alunos e pais de estudantes poderão fazer denúncias anônimas contra os professores, que ficariam também proibidos de estimular seus alunos a participar de manifestações. Em caso de descumprimento da norma, eles estariam sujeitos a processos administrativos e sofrer punições que chegariam à demissão. “‘Escola sem partido’ quer coibir apenas o que for contrário ao governo”, critica Hermes Leão, presidente da APP-Sindicato, que promete mobilizar os professores na sessão de hoje para pressionar pela rejeição do projeto.
Uma ação que questiona a constitucionalidade de uma lei aprovada pela Assembleia Legislativa de Alagoas em 2016, semelhante ao “escola sem partido” aguarda julgamento no Supremo Tribunal Federal. O julgamento estava previsto para novembro do ano passado, mas foi adiado pelo presidente do STF, ministro Dias Toffoli.