domingo, 30 de junho de 2019

Lava Jato desconfiou de empreiteiro que incriminou Lula, diz jornal

Lula: mensagens mostram que Léo Pinheiro só passou a ser considerado merecedor de crédito após mudar diversas vezes sua versão sobre o apartamento tríplex

O empreiteiro que incriminou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no caso que o levou à prisão foi tratado com desconfiança pela Operação Lava Jato durante quase todo o tempo em que se dispôs a colaborar com as investigações, segundo mensagens privadas trocadas entre procuradores envolvidos com as negociações.
Enviadas por uma fonte anônima ao The Intercept Brasil e analisadas pelo jornal Folha de São Paulo e pelo site, as mensagens indicam que Léo Pinheiro, ex-presidente da construtora OAS, só passou a ser considerado merecedor de crédito após mudar diversas vezes sua versão sobre o apartamento tríplex de Guarujá (SP) que a empresa afirmou ter reformado para o líder petista.
“Sobre o Lula eles não queriam trazer nem o apt. Guaruja”, escreveu o promotor Sérgio Bruno Cabral Fernandes a outros integrantes da equipe que negociou com os
advogados da OAS em agosto de 2016, numa discussão sobre a delação no aplicativo Telegram. “Diziam q não tinha crime.” Léo Pinheiro só apresentou a versão que incriminou Lula em abril de 2017, mais de um ano depois do início das negociações com a Lava Jato, quando foi interrogado pelo então juiz Sergio Moro no processo do tríplex e disse que a reforma do apartamento era parte dos acertos que fizera com o PT para garantir contratos da OAS com a Petrobras.
Os diálogos examinados pela Folha e pelo Intercept ajudam a entender por que as negociações da delação da empreiteira, até hoje não concluídas, foram tão acidentadas —e sugerem que o depoimento sobre Lula e o tríplex foi decisivo para que os procuradores voltassem a conversar com Pinheiro, meses depois de rejeitar sua primeira proposta de acordo.
Os advogados da OAS abriram negociações com a Lava Jato em fevereiro de 2016. Nessa época, as investigações sobre as relações de Lula com as empreiteiras estavam
avançando, e os procuradores já tinham muitas informações sobre o tríplex e as obras executadas pela OAS e pela Odebrecht num sítio que o líder petista frequentava em Atibaia (SP). Léo Pinheiro já havia sido condenado por Moro por ter pago propina a dirigentes da Petrobras e recorria em liberdade, mas temia ser preso se a apelação fosse rejeitada pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, onde os processos de Curitiba são revistos.
O empreiteiro foi recebido com ceticismo desde o início. “A primeira notícia de versão do LP [Léo Pinheiro] sobre o sítio já é bem contrária ao que apuramos aqui”,
disse um dos procuradores, Paulo Roberto Galvão, no início de março. “Estamos abertos a ouvir a proposta da empresa mas não nos comprometemos com nada.”
Em abril, após analisar relatos anexados à primeira proposta entregue pelos advogados da OAS, outro integrante da força-tarefa de Curitiba, Januário Paludo, disse aos colegas que achava o esforço inútil. “Tem que prender Leo Pinheiro. Eles falam pouco”, escreveu. “Me parece que não está valendo a pena.”  Uma pessoa que acompanhou as conversas da OAS com a Lava Jato na época disse à Folha que, inicialmente, Léo Pinheiro descreveu o tríplex como um presente que oferecera a Lula sem pedir nada em troca. Segundo essa pessoa, a insatisfação dos procuradores o levou a mudar sua versão pelo menos duas vezes até chegar àquela adotada em 2017.
As mensagens analisadas pela Folha e pelo Intercept mostram que os relatos apresentados pela empreiteira sofreram várias alterações até que os procuradores
aceitassem assinar um termo de confidencialidade com os advogados, passo essencial para que as negociações avançassem. Mas os ajustes feitos pela OAS pareciam sempre insuficientes. “Na última reunião dissemos que eles precisariam melhor(ar) consideravelmente os anexos”, disse o procurador Roberson Pozzobon aos colegas em julho, quando se preparavam para um novo encontro com os representantes da empresa. “Os anexos que a OAS entregou hoje são muito semelhantes Àqueles que a carol enviou antes aqui”, escreveu a procuradora Jerusa Viecili no Telegram após a reunião. “Só há alguns anexos novos.”