quarta-feira, 19 de dezembro de 2018

‘Barriga de aluguel’ é opção cada vez mais frequente entre os futuros pais

‘Barriga de aluguel’ é opção cada vez mais frequente entre os futuros pais

Há muito tempo o empresário Rodrigo Bayer Marder tinha o desejo de ser pai. “Sempre foi um sonho, sempre pensei nessa possibilidade”, conta. Sem encontrar um cônjuge, contudo, se viu na necessidade de tomar uma importante decisão aos 42 anos: afinal, realizaria o sonho da paternidade ou deixaria a história de lado? “Era um momento que ou seria pai ou esqueceria disso. Depois não teria paciência”.

Em março do ano passado, então, o empresário tomou a importante decisão de construir sua família. Optou pelo processo de surrogacy (também conhecido como gestação por substituição ou simplesmente barriga de aluguel), que é feito no exterior, em países como Estados Unidos, Ucrânia e Albânia, sempre seguindo a legislação de cada local.

No caso de Rodrigo (até por tratar-se de um pai solteiro, o que gera restrições em alguns países, bem como com relação a casais homossexuais), a opção foi pelos Estados Unidos. E no último 29 de outubro, finalmente ele se tornou pai. “Tinha muitos medos e receios, mas no final deu tudo certo”, comenta o empresário e agora pai de Eduardo. “Como criei boi, já fiz transplante de embrião. Mas nem imaginava naquela época que um dia isso iria acontecer comigo, porque o processo é praticamente o mesmo.”

Demanda em alta
O trauma de diversas tentativas frustradas em gerar um filho para casais heterossexuais ou a dificuldade burocrática no caso de casais homossexuais tem levado a um maior número de casais procurando pela barriga de aluguel ou surrogacy. Com este processo, uma mulher saudável se dispõe a ajudar um casal ou indivíduo para conceber um filho biológico deles (do casal ou de um deles), caso os mesmos não possam ou não consigam ter um filho por vias naturais.

No Brasil, uma das referências na área é a Tammuz, que atualmente conta com 47 bebês no país e 44 processos em andamento. De 2017 para 2018, o número de bebês gerados pela empresa, cuja matriz fica em Israel, aumentou 35,3%. Só em Curitiba, terceiro principal polo de atuação no país (atrás dos estados de São Paulo e Minas Gerais) já foram três nascimentos e há ainda outras quatro pessoas ou casais com o processo já em andamento. Os custos variam de US$ 49 mil (na Ucrânia) a US$ 110 mil (nos Estados Unidos). Convertendo, isso daria entre R$ 190 mil e R$ 430 mil.

Bruna Alves, gerente da Tammuz Brasil, explica que a empresa e sua equipe acompanham todo o processo, desde a primeira entrevista com o casal ou indivíduo, passando pela coleta do material genético, escolha da doadora ou doador (quando necessário), a escolha da futura gestante, toda a parte burocrática e, é claro, o acompanhamento médico da gestação.

“No geral, o processo como um todo, a partir do momento que o casal decide fazer até o retorno ao Brasil, demora um ano e três meses para se completar. Tudo é feito seguindo a legislação e o casal tem direitos e deveres”, explica Bruna, comentando ainda que a procura pelo serviço aumenta a cada ano. “A maioria das pessoas não sabe que esse tipo de processo existe e nem sabe que é possível fazer algo assim. Muitos estão há anos fazendo tratamento, veem uma reportagem e aí nos procuraram."

E no Brasil, é possível contratar uma gestação deste tipo?
Por aqui, o processo que está regulamentado pelo Conselho Federal de Medicina (CFM) é o de “barriga solidária”. Mas é necessário ter grau de parentesco de até quarto grau entre um dos pais e a mulher que fará o processo da gestação. Além disso, é proibido qualquer tipo de troca comercial e é preciso passar por um processo burocrático para conseguir uma autorização.

“Legislação, porém, não existe, só regulamentações do CFM. Isso é o maior impedimento, porque não dá para fazer um processo desses sem legislação. É algo muito delicado que precisa ser feito com total segurança”, explica Bruna Alves, gerente da Tammuz Brasil. “Estamos sempre acompanhadno novidades por aqui, adoraria uma legislação que abrisse portas, porque o processo ficaria mais barato, mas não sou muito otimista que isso vá acontecer nos próximos anos”, complementa.

Por isso, na Tammuz as gestações são feitas no exterior, nos países que aceitam o procedimento para estrangeiros. Em todos os países, porém, há a exigência de que a gestante não tenha ligação genética com o bebê – ou seja, a doadora de óvulos nunca é a mesma mulher que será a gestante.

Maioria dos clientes são casais heterossexuais
Atualmente 70% dos clientes da Tammuz no Brasil são casais heterossexuais (dado curioso, uma vez que nos outros países a maioria dos casais são homoafetivos), 25% casais homoafetivos e 5% correspondem a homens solteiros. Bruna Alves, inclusive, conta que quando a empresa chegou ao país, o foco inicial eram casais homossexuais.

“Mas vimos que a procura era muito grande de casais héteros, acredito que por conta de problemas de infertilidade, dificuldade de gravidez natural”, comenta a gerente da Tammuz Brasil, apontando que outra situação curiosa do país são os pais solteiros, como é o caso de Rodrigo.

“A maioria me fala que sempre quis ser pai, já tentou relacionamentos, mas não conseguiu e resolveu fazer (o filho) sozinho. Geralmente eles têm a família dando muito apoio. Vem com a mãe, a irmã, a prima. Temos um cliente em São Paulo, por exemplo, que a família inteira está esperando o nascimento da criança, que será no mês que vem”, conta Bruna.

“Não tem por que não contar”
Questionado sobre o que fará quando seu filho, Eduardo, perguntar pela mãe, Rodrigo Bayer Marder aponta que não terá melindre algum em contar a verdade para seu primogênito. “Vou explicar, não tem porque não contar a história direitinho. Além disso, hoje é algo um pouco estranho, mas daqui 10, 15 anos, vai ser mais comum”.

Ele também não descarta, caso o filho deseje, fazê-lo conhecer a doadora do óvulo ou mesmo a mulher que lhe carregou no ventre ao longo de nove meses. “A barriga é mais fácil, porque tive contato com ela. A doadora eu tenho foto e ela escreveu que se um dia a criança quisesse conhecê-la, poderia. Mas vai da vontade dele. Se quiser conhecer, poderá conhecer.”