quarta-feira, 19 de abril de 2023

Comunidade internacional pode afastar-se de Lula, alertam embaixadores estrangeiros


 











A postura do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) em relação à guerra na Ucrânia pode afastá-lo de líderes estrangeiros e reduzir o diálogo do Brasil com a comunidade internacional, segundo avaliações de embaixadores de países ocidentais lotados em Brasília.

A CNN conversou reservadamente com três chefes de representações diplomáticas na capital brasileira e ouviu palavras como “irritantes”, “decepcionantes” e “infelizes” para descrever as falas de Lula.

Todos eles convergem na análise de que a vitória do petista foi muito bem recebida no exterior e houve satisfação com a volta do Brasil ao cenário internacional, depois de anos de relações tumultuadas com o governo de Jair Bolsonaro (PL).

Lula, segundo a descrição dos embaixadores, tem crédito acumulado por suas gestões anteriores em três áreas-chave: defesa da democracia, respeito aos direitos humanos, proteção da Amazônia/combate às mudanças climáticas.

Diz, no entanto, um embaixador europeu: “O mundo de 2023 não é o mundo de 2003 ou de 2010, que aceitava e até pedia uma presença maior do Brasil. Hoje o ambiente global é de divisão geopolítica e o espaço para protagonismo do Brasil, até pela perda de importância econômica, é menor”.

De acordo com esse representante estrangeiro, é ilusório acreditar que se pode manter uma relação equidistante do Ocidente e da China, beneficiando-se do que cada um pode oferecer de melhor e sem a necessidade de fazer escolhas. “Em algum momento, o governo brasileiro precisará escolher de que lado fica mais próximo”, afirma.

Uma observação feita por esse diplomata: Lula esteve em Washington e não criticou a China, mas aproveitou sua ida a Pequim para atacar os Estados Unidos e insinuar que a Casa Branca prolonga intencionalmente o conflito na Ucrânia.

Ponto de consenso entre os embaixadores: a postura recente de Lula não coloca minimamente em risco o relacionamento econômico e comercial do Brasil com seus países. Dificulta, porém, o trabalho de aprofundamento das relações e a abertura de novas frentes de parcerias. Cria um clima de desconfiança e menor cooperação para explorar outras agendas bilaterais.

As críticas mais duras surgem quando se comenta a aproximação de Lula e seus auxiliares com a Rússia. Um dos episódios citados, que passou praticamente despercebido na imprensa brasileira, foi uma votação no Conselho de Segurança da ONU no mês passado.

No dia 27 de março, a Rússia apresentou proposta de resolução para estabelecer investigações sobre “atos de sabotagem” no gasoduto Nordstream, no Mar Báltico, que escoa gás russo para a Europa.

A resolução foi rejeitada, mas houve três votos favoráveis: Rússia, China e Brasil. “É um péssimo sinal estar ao lado de Vladimir Putin em qualquer votação”, diz um embaixador.

A viagem discreta de Celso Amorim ao Kremlin e a passagem do chanceler russo Sergei Lavrov por Brasília deixaram a comunidade internacional em alerta.

Para os diplomatas ouvidos pela CNN, as declarações recentes desabilitam o Brasil da condição de potencial facilitador de um processo de paz, por suposto desequilíbrio no tratamento dado à Ucrânia.

Uma das críticas tem como alvo um comentário de Amorim à CNN, na semana retrasada, quando disse que a facilitação de um processo de paz requer países “militarmente e emocionalmente” distantes da guerra.

“Se os Estados Unidos tivessem invadido a Venezuela, o Brasil ficaria emocionalmente distante?”, questiona um embaixador europeu.

Ninguém fala em um afastamento imediato — a continuar o nível atual de contatos com Moscou — de líderes ocidentais. No curtíssimo prazo, inclusive, pode-se dizer o contrário: Lula foi convidado para ir à cúpula do G-7 no Japão, vai para Portugal e Espanha na próxima semana, deve receber o francês Emmanuel Macron em breve.

O que se prevê, entre os diplomatas ouvidos pela CNN, é um monitoramento cuidadoso dos próximos passos do governo brasileiro. Se a escalada de críticas aos Estados Unidos e à União Europeia prosseguir, o diálogo tende a diminuir gradualmente daqui em diante.

“Se o Brasil se alinhar às visões russas sobre a guerra, não haverá a menor possibilidade de participação em qualquer processo de paz”, diz um embaixador.

Esse mesmo diplomata complementa com o que considera uma leitura otimista da postura de Lula: ele, no fundo, condenaria Putin e suas hostilidades contra a Ucrânia como qualquer outro líder ocidental.

Só estaria acenando com um discurso mais antiamericanista para agradar setores da esquerda brasileira, mas sem acreditar em todas as declarações que faz.

Por CNN