terça-feira, 16 de maio de 2023

Crise da vez: temendo consequências, políticos correm para conter escândalo de apostas


 














O assédio a profissionais do futebol com o objetivo de manipular o mercado de apostas não é exatamente uma novidade no Brasil, mas as revelações mais recentes forçaram um senso de urgência em membros dos Poderes da República e em gestores esportivos. O temor é de que o escândalo cresça, afete fortemente a credibilidade do esporte mais popular do país e cause enormes prejuízos econômicos e no humor geral da nação no caso, por exemplo, do Campeonato Brasileiro deste ano ter que ser interrompido se novas denúncias surgirem.

O esquema começou a ser desvendado ainda no ano passado pelo Ministério Público de Goiás. Agora, que nova denúncia dos promotores goianos cita 53 jogadores e implica alguns dos maiores times do país, começou uma corrida em busca de conter os danos e evitar um agravamento.

O governo federal e o Congresso entraram com força no assunto. Uma fonte no Palácio do Planalto contou ao Metrópoles que há um sentimento de medo entre as autoridades porque a investigação goiana identificou apenas uma quadrilha de apostadores-aliciadores. Há, no ar, a quase certeza de que o esquema de manipulação de resultados pode ser bem maior e envolver mais criminosos.

Com isso, diz a mesma fonte, a questão das apostas está tomando o lugar prioritário no primeiro escalão federal que já foi do enfrentamento à violência nas escolas e, antes disso, das consequências dos ataques de 8 de janeiro. Ainda que haja uma CPI Mista para ser instalada no Congresso sobre os atos golpistas, esses assuntos já não chamam mais tanta atenção na mídia nem nas redes sociais – e, consequentemente, também perderam espaço na agenda política.

As providências

No âmbito do Executivo federal, as ações contra a máfia das apostas envolvem regulação e investigação. O Planalto apressou a elaboração de uma Medida Provisória que regulamenta e taxa o mercado de apostas esportivas e o ministro da Justiça, Flávio Dino, determinou que a Polícia Federal abrisse um inquérito para investigar o esquema. Segundo ele, a apuração deverá apresentar “fatos concretos” em breve, como operações de busca e bloqueios de bens.

O próprio presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) falou a Dino sobre a importância da investigação.

A MP com a regulação do mercado de apostas esportivas online já está na mesa de Lula esperando por sua assinatura para publicação. O texto foi escrito pela equipe de Fernando Haddad, no Ministério da Fazenda, e teve a contribuição de técnicos de outras pastas.

O documento prevê que as empresas, hoje registradas no exterior, terão de se habilitar no Brasil para poderem receber apostas no país e serão tributadas em 16% do lucro líquido (já subtraídos os prêmios pagos aos apostadores). Já os ganhadores terão de pagar 30% de taxas sob o que lucrarem com apostas quando esses ganhos superarem o atual valor de isenção no Imposto de Renda: R$ 2.112.

A arrecadação com essa taxação, estimada pelo governo em até R$ 15 bilhões por ano, irá para áreas como segurança pública, educação, desenvolvimento social. Uma parcela será destinada às agremiações esportivas nas quais os jogadores apostam.

O texto da MP prevê ainda a criação de uma secretaria no Ministério da Fazenda para credenciar e fiscalizar as empresas de apostas.

Entre as mudanças legislativas que já foram propostas estão o PL 515/2023, do deputado federal Bandeira de Mello (PSB-RJ), que aumenta a pena de profissionais do futebol envolvidos com manipulação de resultados. Há ainda o PL 1931/2023, proposto por Luciano Vieira (PL-RJ), que proíbe a atuação de sites não registradas no Brasil e veda apostas de menores de idade.

Pressa que segue o atraso

O poder público se debruça de verdade sobre o tema das apostas esportivas no momento em que o mercado já está consolidado no país. De acordo com a empresa especializada BNL Data, existem aproximadamente mil sites de apostas atuando no país e eles movimentam, por ano, entre R$ 120 bilhões e R$ 150 bilhões – sem pagar nada de impostos. Elas patrocinam atualmente 39 dos 40 clubes das Séries A e B do Campeonato Brasileiro – tirando apenas o Cuiabá.

A falta de regulação fere ainda os direitos de consumidores que se sentirem lesados por algum desses sites, afinal não há muitas maneiras de reclamar de empresas sediadas em paraísos fiscais e cujos donos na maioria das vezes são ocultos.

Esse tipo de aposta era proibida no Brasil até 2018, quando o então presidente Michel Temer (MDB) sancionou a MP 846, regulamentando as apostas esportivas no modelo de quotas fixas (nome oficial desse tipo de jogo virtual). O texto previa que uma regulamentação dessa modalidade de aposta fosse feito em até dois anos. Mais isso só está sendo feito cinco anos depois – e com a pressa provocada pelo escândalo.

Por Metrópoles.