segunda-feira, 10 de dezembro de 2018

Polícia faz busca em gabinete de deputado estadual do PR em investigação sobre fraude à fila do SUS

Gabinete do deputado Ademir Bier (PSD), na Alep, foi alvo de busca e apreensão — Foto: Arquivo pessoal
Hospital São Lucas, em Campo Largo, foi alvo da operação do Gaeco — Foto: Helen Anacleto/RPC

O gabinete do deputado estadual Ademir Bier (PSD) na Assembleia Legislativa do Paraná (Alep) e endereços ligados a ele foram alvo de busca na manhã desta segunda-feira (10), em uma operação do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). A ação mira um suposto esquema de propina entre médicos e empresários para furar a fila do Sistema Único de Sáude (SUS).

O Gaeco chegou à Alep por volta das 7h. Treze pessoas foram presas. A Justiça havia expedido 12 mandados de prisão temporária. A décima terceira prisão foi em flagrante: um médico que estava com munição.
Os 44 mandados de busca e apreensão também foram cumpridos, conforme informou o Gaeco no fim desta manhã.


Os valores cobrados dos pacientes variavam entre R$ 2 e R$ 8 mil, de acordo com o coordenador do Gaeco, Leonir Batisti.

Conforme o promotor do Gaeco Hugo Corrêa Urbano, o dinheiro ficava com os médicos. O promotor explicou que os interesses dos políticos eram eleitorais e não financeiros.

Batisti afirmou que os pacientes são tratados como vítimas.

"Não só imoral como contraria a lei, porque se nós criamos um sistema. Nós colocamos as pessoas em igualdade de condições. Então, o que deve ser atendido antes é aquele justificável pela emergência e não uma pessoa com a mesma emergência que outra ser passada pra trás na fila porque não paga a parte", disse Batisti.

Segundo o Ministério Público do Paraná (MP-PR), as prisões temporárias foram expedidas contra dois médicos, assessores, secretárias e intermediadores. Um desses intermediadores, de acordo o MP-PR, é um vereador de Bandeirantes, município do norte pioneiro.

O vereador de Bandeirantes é José Carlos Martins, chamado de Zé Mano.

'Despachante'

Conforme o coordenador do Gaeco, pessoas que precisavam de cirurgia ligavam para Paulo Roberto Mendes de Morais, conhecido como Paulinho, assessor de Ademir Bier.

Esse assessor atuava como "despachante". Paulinho entrava em contato com médicos que cobravam propina para fazer o procedimento, conforme Batisti.

O deputado, ainda segundo o coordenador do Gaeco, se beneficiava politicamente, com votos, ao dar "carteiradas" com a influência que tinha. Ademir Bier não foi reeleito nas últimas eleições, portanto, o mandato do deputado acaba no fim deste ano.

O Gaeco chegou, por volta das 6h, ao escritório do deputado que fica no Centro de Marechal Cândido Rondon, no oeste do estado. A equipe do Gaeco permaneceu cerca de duas horas e meia no local e recolheu diversos documentos.

Depois, o Gaeco foi até o prédio onde mora o deputado para cumprir outro mandado de busca e apreensão. Porém, Ademir Bier não se encontrava. Segundo funcionários, ele viajou na noite de domingo (9) para Curitiba.

'Profundamente' envolvido

De acordo com o MP-PR, Paulinho, assessor está "profundamente" envolvido no esquema e na organização criminosa.

Um diálogo, do dia 8 de outubro deste ano, ele reclama que Ademir Bier perdeu as eleições, mesmo com o esquema que montaram de furar a fila do SUS.

Nessa oportunidade, conforme o MP-PR, Paulinho deu a dimensão do esquema e da organização criminosa, dizendo que fazia dez anos que desenvolvia esse tipo de trabalho, tendo atendido mais de 15 mil pacientes e encaminhado mais de 10 mil cirurgias.

Com a derrota de Ademir Bier, em uma conversa por telefone com um dos vereadores envolvidos, Paulinho disse que tinha planos de abrir um escritório próprio e, mediante pagamento, fazer os agendamentos de consultas para o SUS, pois tinha contato direto com os médicos.

Pavão

Lourival Aparecido Pavão que, conforme o Gaeco, era ex-assessor de Ratinho Junior (PSD) – eleito governador do Paraná – é um dos alvos de prisão. A defesa de Pavão informou que está estudando o processo e que vai se manifestar quando tomar ciência de toda situação.

Pavão ocupava o cargo de assessor de Ratinho Junior, quando ele era deputado, segundo o Gaeco. Pavão, ainda conforme o Gaeco, "parece ser um dos agentes mais envolvidos na intermediação e nos agendamentos preferenciais de consultas e cirurgias pelo SUS, mediante pagamento de quantias".

O Gaeco afirmou que Ratinho Junior não é investigado.

A assessoria de comunicação do Ratinho Junior confirmou à RPC que Pavão era assessor parlamentar dele e foi exonerado em setembro deste ano. Segundo a assessoria de imprensa do governador eleito, Pavão trabalhava na área de assistência social, sendo a ponte entre pacientes e hospitais.

A assessoria de comunicação ainda disse que Ratinho Junior recebeu com surpresa a notícia de que o ex-assessor estava envolvido com essas irregularidades e que nunca teve conhecimento de nenhuma delas. Também foi relatado que o governador eleito está analisando quais medidas administrativas vai tomar em relação ao caso.

No site da Transparência, da Assembleia Legislativa, consta que até agosto deste ano Pavão era funcionário comissionado da 1ª vice-presidência da Casa, ocupada pelo deputado Guto Silva (PSD). Guto Silva foi indicado, por Ratinho Junior, para assumir a chefia da Casa Civil em 2019.

Antes, Pavão era comissionado da liderança do PSC.

Em um diálogo captado em outubro deste ano, Bier afirmava que iria fazer apenas "mais um pessoal doente" e que, depois, pararia porque não haviua surtido o efeito desejado.

Conforme os diálogos captados, Pavão passava o dia todo encaminhando pacientes, principalmente para o Hospital São Lucas. Ali, mediante pagamento de vantagem indevida, os pacientes eram atendidos com prioridade.

Ainda segundo o MP-PR, além de usar o celular para captar e encaminhar os pacientes para os hospitais, Pavão usava o telefone fixo do diretório estadual do PSC para a organização dos esquemas criminosos.

Em uma das conversas telefônicas, Pavão contou, em tom de deboche, a situação de uma paciente do SUS, da qual foi cobrado R$ 3 mil, mas que o filho dela dizia que o médico havia combinado R$ 1,5 mil.

O estado de saúde dessa paciente piorou, e ela precisou ser internada na Unidade de Terapia Intensiva (UTI). Para visitá-la, o filho teve que pagar os R$ 1,5 mil restantes. "É, o cara faz aqui, aqui mesmo paga, né", disse Pavão na ligação.