segunda-feira, 21 de dezembro de 2020

Novo coordenador da Operação Greenfield propõe encerrar investigações no MPF: ‘Não estou aqui para trabalhar muito’


 












O novo coordenador da Operação Greenfield, o procurador Celso Três, nomeado recentemente pela Procuradoria-Geral da República (PGR) para comandar o caso, enviou um ofício para a PGR com uma proposta que na prática encerraria a Greenfield dentro do Ministerio Público Federal. Em seu ofício, Celso Três se recusa a dar prosseguimento às investigações em andamento, sugere que tudo seja enviado à Polícia Federal para que a PF toque sozinha a operação e propõe que sejam celebrados acordos com os alvos investigados, para chegar a um desfecho rápido.

O procurador ainda sugere que não deve ser ele o responsável por apresentar ações na Justiça sobre os crimes e desvios nos fundos de pensão, mas sim os próprios fundos de pensão. No ofício de 14 páginas, Celso Três afirma que não quer “trabalhar muito”, pede compensações financeiras por ter assumido o caso e faz críticas à Lava-Jato. “Decididamente, não estou aqui para trabalhar muito. Já o fiz na ‘gringolândia'(roça, região italiana do RS) e, chegado a Porto Alegre a bordo do êxodo rural, servido por apetitoso ‘x-mico’(pão e banana) no correr de largo tempo. Ou seja, trabalhei pela sobrevivência, não porque achasse bom. Hoje, quero é jogar futebol”, escreveu.

Procuradores do MPF veem no ofício de Celso Três uma proposta direta para acabar com a operação.

A Força-Tarefa Greenfield, do MPF em Brasília, que investiga desvios bilionários em fundos de pensão de estatais, foi perdendo força durante a gestão do procurador-geral da República Augusto Aras, depois que a PGR retirou a exclusividade de alguns dos seus integrantes, em meio a um movimento de conflito com as forças-tarefas. Com isso, o procurador natural do caso, Anselmo Lopes, pediu para sair do caso e deixou a PGR com o ônus de encontrar um substituto. A força-tarefa contabilizava ter recuperado mais de R$ 11 bilhões aos cofres dos fundos de pensão, por meio de ações judiciais e acordos de colaboração premiada.

No fim de novembro, a PGR nomeou Celso Três para assumir o caso, sob o argumento de que ele foi o único a se apresentar voluntariamente em uma consulta interna do MPF.

O ofício do procurador foi enviado para a 5ª Câmara de Coordenação e Revisão da PGR, órgão responsável por coordenar os casos de combate à corrupção e improbidade administrativa. Ele encerra o ofício fazendo três propostas: o envio de toda a investigação para a PF, sem ser mais conduzida pelo Ministério Público Federal; a criação de uma “linha de produção” de Acordos de Não Persecução Penal, para encerrar os casos apenas celebrando acordos de forma automatizada; e o “declínio imediato” de todos os casos da Greenfield que não significarem “lesão direta e imediata aos fundos de pensão”.

Celso Três afirma ter assumido uma “montanha de processos” e elogia o trabalho da força-tarefa, que classifica de “hercúleo”. Mas ele diz que as investigações se ampliaram excessivamente e afirma que apenas uma “linha de produção” de acordos de não persecução penal poderia resolver o caso. “Se nos embrenharmos no mar dos R$ bilhões/trilhões decantados pelo Anselmo no Simba (sistema de movimentação bancária) e RIFs do Coaf, nadaremos, nadaremos e sucumbiremos abraçados. Precisa surfar e não abraçar a onda”, escreveu.

Mas Celso Três sugere que até mesmo a responsabilidade por esses acordos fique com a Polícia Federal, excluindo o MPF da investigação. Apresenta como justificativa o seguinte argumento: “Procurador(a) não mete medo em delinquente algum, especialmente do colarinho branco. Está na cara. Vejam face relaxada e sorridente de quem adentra a Procuradoria da República. Vejam quem assim porta-se em Delegacia de Polícia”.

Ainda no seu texto, ele chega a alertar que caso algum procurador decida tocar as investigações, deverá assumir o ônus da carga de trabalho. “Procurador(a) que entendesse proceder convencionalmente, investigando, levando ‘sponte propria’, ANPP e ações adiante, claro que poderá fazê-lo. Porém, saiba que sua carga não poderá, a exemplo da Greenfield, ser devolvida adiante a seus Pares”, escreveu.

Por último, caso os acordos não sejam celebrados, ele diz que são os fundos de pensão que devem cobrar os prejuízos. “Não consumado ANPP/I, sabido que a condenação criminal e improbidade tem requisitos muito além da responsabilidade civil contratual, fundos devem ajuizar as demandas”, escreveu.

Na conclusão do seu ofício, Celso Três diz que aguardará um posicionamento da PGR sobre suas demandas e arremata: “Não há pressa, pois agora é para ficar tudo parado mesmo”.

O Globo