O governo brasileiro encara o tarifaço e as sanções impostas pelos Estados Unidos ao Brasil como uma tentativa de “mudança de regime” e acredita que as ações de presidente Donald Trump não se restringem a pressão sobre o julgamento do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL) pelo STF (Supremo Tribunal Federal), marcado para setembro.
Para uma fonte do Planalto, as ações de Trump visam a influenciar o processo eleitoral brasileiro. Nessa visão, a ideia do governo americano é garantir que exista um candidato com afinidade ideológica com Trump na cédula eleitoral da eleição presidencial do Brasil em 2026.
O governo brasileiro também acredita que, caso haja vitória do presidente Lula (PT) no ano que vem, haverá questionamento da legitimidade da disputa no Brasil por parte de Trump. O deputado Eduardo Bolsonaro (PL-SP) vem afirmando há meses que, se Bolsonaro não estiver na cédula, os EUA não vão reconhecer a eleição no Brasil.
O Planalto vê um movimento dos EUA de reafirmar a América Latina como seu quintal. Além de pressionar pela absolvição de Bolsonaro no julgamento do STF e criticar a prisão do ex-presidente da Colômbia Álvaro Uribe (de direita), Washington manifestou apoio à prisão da ex-presidente Cristina Kirchner (de esquerda) na Argentina.
No final de julho, o nomeado de Trump para ser o próximo embaixador americano na Argentina, Peter Lamelas, afirmou que Cristina deveria “receber a justiça que merece”. “Se ela não fosse política, estaria na prisão. Ela está em prisão domiciliar por algum tipo de favoritismo político”, afirmou.
O secretário de Estado americano, Marco Rubio, saiu em defesa de Uribe, dizendo que seu único crime foi “lutar e defender incansavelmente sua pátria” e acusou o Judiciário de ser “instrumentalizado” por “juízes radicais”.
Uma das estratégias do governo brasileiro para não ficar isolado na América do Sul, para evitar um “grupo de Lima” contra o Brasil, como afirmam integrantes do governo, é criar vínculos com governos de direita na região. O grupo de Lima foi formado em 2017 com chanceleres de países com governos de direita e centro-direita da região que pressionavam pela saída do ditador Nicolás Maduro do poder na Venezuela e apoiavam o opositor Juan Guaidó.
Fontes apontam para a visita do presidente de centro-direita do Equador, Daniel Noboa, a Brasília na segunda-feira (18), onde se reúne com Lula, como parte dessa aproximação com a direita. No caso da Argentina, apesar de não haver aproximação com Javier Milei, o Brasil está comprando gás do país.
Com a Unasul extinta e a Celac bloqueada, o Brasil quer usar o Mercosul e a OTCA para discutir temas que podem unir a região, como mudança do clima e cooperação energética.
Além disso, Lula vai continuar com seu movimento de aproximação com países afetados pelas tarifas de Trump. Nesta semana, ele irá conversar por telefone com o presidente da França, Emmanuel Macron, o chanceler alemão, Friedrich Merz, a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e o presidente da África do Sul, Cyril Ramaphosa.
Folha de S.Paulo