quinta-feira, 4 de novembro de 2021

PEC dos Precatórios e a instituição do calote no Brasil













 Ao apagar das luzes, deverá ser votada hoje, no Congresso Nacional, a Proposta de Emenda Constitucional dos precatórios ou “PEC do Calote” como ficou conhecida, que cria um teto para o pagamento de dívidas judiciais da União em 2022. A proposta do Governo Federal agride pilares fundamentais do Estado Democrático de Direito e ataca duas cláusulas pétreas da Constituição — separação dos Poderes e direitos e garantias individuais— e possui mais de 30 violações constitucionais.

Se aprovada, a alteração na Constituição permitirá que o Estado não cumpra uma de suas obrigações mais básicas, que é pagar os credores e prejudicará todos aqueles que ganharam ações na Justiça. Ou seja, vamos ter o calote institucionalizado no país e uma apropriação abusiva por parte do Estado de recursos dos cidadãos e empresas. Aqui, vale destacar que 80% desses precatórios são de caráter alimentar, normalmente de aposentados e pensionistas que brigam há décadas na Justiça e agora serão punidos novamente.

Pela proposta, haverá um limite para o pagamento de precatórios com base no gasto de 2016 (ano de criação do teto de gastos) corrigido pela inflação, o que reduz o valor do próximo ano de R$ 89 bilhões para cerca de R$ 45 bilhões. Nas contas da Consultoria de Orçamento da Câmara dos Deputados, a fila de pagamentos deve ficar entre R$ 200 bilhões e R$ 250 bilhões até 2026. Ou seja, seriam necessários pelo menos quatro anos para pagar os precatórios postergados apenas de 2022.

Um absurdo. Absurdo esse que vem tendo anuência até do Ministro Luiz Fux, presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), que encontrou uma “solução” para o drible ser viável, o que apenas desmoraliza o Judiciário. Afinal, a ideia de pagar a dívida de acordo com a lei do teto de gastos, separando os precatórios que seriam pagos em 2022 dos que serão pagos em 2023, o que chamam de “microparcelamento”, surgiu de reuniões entre Pacheco, Lira e Fux, que juntos trabalharam na tentativa de tornar palatável uma medida antidemocrática, impopular e atentatória à estabilidade das finanças públicas e da moeda nacional.

Aos desavisados, lembro que o pagamento de precatórios não está na esfera de decisão do poder público, não é problema de finanças públicas. É uma obrigação reconhecida pela Justiça. Uma proposta como essa agride todos os brasileiros, um descaramento com o cidadão seja pelo seu teor ou pela sua justificativa, pois utiliza como subterfugio o pretexto de que o calote servirá para distribuir dinheiro aos famintos. Em que pese a louvável intenção, ficou evidente a falta de habilidade do governo na viabilização de outras fontes de financiamento para implementar essa e outras políticas públicas.

Por: Tatiana Mendes Cunha – Advogada